Chego de férias, dias sem internet, e o Bissexto não abre: só há uma mensagem em inglês sobre a tela branca, dizendo que fui raqueado. Gelei, porque nunca me preocupei com fazer cópias de segurança, o que significava a possibilidade de ter perdido todos os meus quase duzentos textos.
Senti certo alívio ao entrar na página de edição: os textos estavam lá, embora desconfigurados. Pouco familiarizado com informática, procurei o Rodrigo Moraes, que providenciou a contratação de programador, e aqui estou, ainda sem o formato original, que, com alguma paciência, será depois recuperado.
Embora o susto, não foi surpresa, e esperava que um dia acontecesse, motivo pelo qual já havia planejado tomar medidas de prevenção, sempre adiadas por outras urgências. O fato é que a internet é assim, e o que escreves não está protegido. Há poucos dias reli, em papel amarelecido, um escrito de quarenta anos, e nele as palavras estão preservadas. Não é o que acontece na telinha, onde palavras são fumaça, ainda que geralmente permaneçam na nuvem.
Mas, por falta de ambição ou pouca habilidade, o raqueador nada mais fez que retirar o Bissexto do ar por alguns dias e impor um pequeno trabalho de recuperação. Talvez seja mesmo um exibicionista, que, como o pichador que deixa sua marca registrada em parede recém pintada, contentou-se com fazer aparecer na tela branca um hacked by.
Nem ao menos parece um desses ataques organizados, como os que recentemente atingiram vários saites de oposição, em que ficou clara a digital de grupos direitistas dedicados a minar qualquer resistência às políticas de retirada de direitos e de entrega do patrimônio nacional.
Pelo jeito, é não mais que um desses milhares de vândalos que infestam a internet, com seus pequenos estragos dirigidos contra o que veem na frente, arraia miúda diante do gigantismo dos grandes golpes e das espionagens de governos e empresas, que tudo sabem a nosso respeito e leem até nossos pensamentos.
Mesmo assim, e com todo o transtorno causado, senti bem lá no fundo uma alegria, ao pensar: fui raqueado, logo existo!
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Sigo a escola do Luís Fernando Veríssimo e do Mauro Caum Gonçalves, e por isso escrevi raquear, mas no título mantive o formato inglês no particípio hackeado, para não causar estranheza ao primeiro olhar. A ilustração é dele, René Descartes, por Frans Hals.
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