Circulou esses dias a afirmação de Stephen Hawking de que a humanidade pode ser extinta em trinta anos. Como me habituei a ver os títulos na correria e ler os textos depois – se tiver tempo, se lembrar, se ainda os achar, se outras coisas não me chamarem a atenção antes –, me contentei com o título e o comentei com algumas pessoas.
Tornei-me, desse modo, um agente involuntário da pós-verdade, e nas conversas colhi o que a pós-verdade causa, desde o atestado de senilidade de Hawking até a validação da sua profecia, com pequenas variações sobre o tempo que nos resta.
Depois consegui ler os textos, e constatei, primeiro, que nossos respeitabilíssimos jornais não repetiam na matéria o título catastrófico que lhe haviam dado; além disso, dias depois entenderam adequado dizer que a fala do cientista não havia sido bem entendida na tradução.
Mas o fato é que Hawking está convencido de que, sob pena de extinção da espécie, precisamos estabelecer logo colônias em outros sítios, a iniciar pela Lua e por Marte, passando num momento seguinte para outros sistemas solares.
Ele menciona três possíveis causas de extinção: a catastrófica, e estatisticamente inevitável, queda de um meteoro gigante, a superpopulação e o aquecimento do planeta.
Se penso nas três hipóteses, vejo duas diferenças fundamentais da queda do asteroide para as demais. A primeira é de que não tem causas humanas, dependendo unicamente da trajetória errática de corpos celestes, que um dia inevitavelmente darão uma grande trombada; a segunda é a de que opera numa larguíssima dimensão de tempo.
Não estamos livres da possibilidade de um choque mortal daqui a meio ano, mas não nos preocupamos, porque sabemos que não é todo dia que caem meteoros gigantes; aquele de dez quilômetros de diâmetro que extinguiu os dinossauros – mas não os mamíferos – caiu há 65 milhões de anos.
Por isso, imagino sejam maiores as chances de que o meteoro caia num tempo tão distante que nossos descendentes, que vagamente lembrarão os humanos de hoje, já terão desenvolvido técnicas para destruí-lo ou desviá-lo. Aliás, na ignorante ousadia de leigo palpiteiro, imagino seja mais fácil desenvolver tecnologia que evite a queda de um meteoro do que aquela que nos permitirá fazer a mudança em viagem interestelar de alguns anos-luz.
Mas o que me chama mesmo a atenção não é o meteoro, mas os outros fatores que poderão causar nossa extinção, porque têm causa humana e ação de curto prazo. Aliás, uma não só tem causa humana como é literalmente humana: o excesso de gente, que inviabilizará nossa própria vida, não antes de termos causado a devastação da Terra e a extinção de inúmeras outras espécies.
Mas as duas – superpopulação e superaquecimento – resultam unicamente de nossas próprias opções, nossa política, nossa economia. Desde sempre me questiono sobre aquela lei básica da economia, de que se não houver crescimento virá o caos. É assim mesmo? Precisamos crescer indefinidamente, para além da capacidade da Terra de nos suportar? Não é possível inventar uma economia sustentável, com uma população humana estabilizada e em harmonia com o planeta?
Evidentemente, isso imporia políticas totalmente diferentes de todas aquelas até hoje adotadas, numa total inversão de postulados sempre tomados como certos. Mas isso não interessa, e continuamos alegremente pisando no acelerador, como se não houvesse na frente uma curva e um precipício.
Talvez haja quem hoje pensa soluções, mas não vejo isso acontecer no âmbito dos governos, dos organismos internacionais ou das grandes corporações. Também não vejo cientistas ou economistas se preocuparem com isso. Tampouco a esquerda o faz. E quem se preocupa parece tão descrente em soluções domésticas que sugere nos mudarmos de planeta.
De fato, é utópico imaginar que consigamos refrear esse instinto de crescimento, e sou suficientemente realista para concordar com Hawkings: a humanidade precisa urgentemente achar outros lugares para viver, a humanidade precisa fugir do que a humanidade causa. E isso muito antes do próximo meteoro.
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