Nunca reverenciar. Nem exigir reverência. Sabia que poucos leriam, mas deu gosto escrever. Foi um duplo prazer: recordar, afazer que se torna mais assíduo com o passar do tempo, e dar essa declaração libertária, de quem professa o credo da igualdade.
Logo confirmei minha expectativa: como não tratava de tema polêmico da atualidade, de fato ninguém leu. Mas, isso era o de menos, porque, como disse no meu texto de apresentação, o que me importava era dizer; ser ou não lido era outra história.
Por isso, me surpreendi esta semana: passados alguns meses, minha ferramenta de acompanhamento me avisou de vários acessos ao texto. Se diversas pessoas leem no mesmo dia um texto abandonado ao marasmo, só imagino uma hipótese: alguém o achou por acaso e entendeu valer a pena recomendá-lo a seus amigos.
Daí bateu a curiosidade: quem de tal modo se sentiria identificado com o que escrevi? Fui ver de onde eram os leitores. Funchal!
Ser lido no Funchal? Por várias pessoas? Isso despertou em mim um sentimento estranho, um certo encantamento, uma sensação de sintonia. Lá no além-mar, na terra da prenda Dominga e da china Ribeira, na misteriosa Madeira, haviam ecoado minhas palavras de liberdade.
Quem são esses leitores do Funchal, que identidade é essa, que faz absorver despretensiosas palavras escritas em Porto Alegre, que as faz viajar tão longe?
Você que me lê agora e provavelmente não é do Funchal certamente não verá significado nenhum nisso que agora falo. Você dirá: os tempos são de internet, e o Facebook te permite falar com o mundo, podes ter amigos em Hong-Kong. Ou em Macau, se fores monoglota.
Sim, tudo isso é muito possível agora, e dificilmente quem alimenta um blog deixa de ser em algum momento lido em outras partes do mundo. Eu mesmo tenho registrados acessos de lugares remotos e improváveis (e logo aprendi que a maior parte deles nada tem a ver com leitores reais), só não tinha visto um texto em particular, e justamente um texto da alma, ser assim lido por pessoas de um único lugar. Do Funchal.
Por isso, a pergunta. Quem são? Quem compartilha lá longe a ideia de não reverenciar? Que mistério é esse, que estranha comunhão?
Acho que não saberei. Mas devo retificar a ideia do meu texto de apresentação. Ser lido pode até ser outra história, uma consequência póstuma da escrita lançada, mas representa também a realização da ideia. Não reverenciar é bom, não reverenciar junto é melhor e não reverenciar com quem não conheço traz universalidade. A mim, a meu texto, à minha ideia. À ideia de não reverenciar.
Graças aos leitores do Funchal. Às almas que não conheço do Funchal.
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