Ponte é uma metáfora poderosa. Em política, como na vida, a capacidade de construir pontes diz muito com a aptidão para viabilizar a convivência entre diferentes.
Em sentido contrário, sua destruição indica a inviabilização de acordos, a intransigência, no limite a impossibilidade de honrar o compromisso democrático, esse da democracia liberal que o Ocidente construiu, com tantas idas e vindas.
Já há um bom tempo, as condições não estão propícias para construir pontes. A crise permanente do capitalismo torna cada vez mais difícil manter a legitimidade de um sistema construído a partir do pacto democrático.
A desesperança da classe média – e também dos pobres – com a possibilidade de melhorar sua vida cria a base social para o fascismo e sua vocação ao rompimento do compromisso democrático, e o capital não perde tempo, abrindo alegremente mão do modelo liberal, quando sua leitura do processo histórico sugere a maior viabilidade da solução fascista.
Logo, passa a investir nessa outra vertente que destrói pontes, e a normaliza, o que se pode perceber bem do modo como seu principal partido, a grande mídia, trata as constantes agressões à democracia pela extrema direita.
Políticos inexpressivos e inescrupulosos são legitimados, e nem ao menos tentativas de golpes de estado e planos de assassinato do presidente e vice eleitos e de ministro do Supremo geram escândalo ou indignação.
Há uma sinalização de que a democracia não é mais tão importante e que esse ator político que destrói pontes é bem-vindo num jogo em que, afinal, talvez ele seja necessário para fazer o serviço sujo.
Mas, se destruir pontes significa deixar sem comunicação quem está de um lado e de outro do rio, agora as pontes passaram a se prestar para um novo tipo de metáfora, mais perverso, se é que pode ser acrescentada ao fascismo alguma perversidade além da que já lhe é inerente.
De fato, para quem planeja envenenar o presidente, jogar alguém da ponte não é surpreendente, e o que há de novo não é a conduta, mas a imagem que a desvela: ver o policial jogar uma pessoa da ponte parece chocar mais que apenas ouvir a notícia de que o presidente seria envenenado.
Mas serve a metáfora, que mostra bem como age o fascismo, independente de que o autor da ação seja o conspirador que planeja envenenar ou seu comandante, discípulo de Brilhante Ustra; seja o policial que joga da ponte ou o governador que estimula a violência.
Hoje um faz pedido patético de anistia, para pacificar a nação, depois que deu errado o golpe; o outro faz autocrítica da dispensa do uso de câmeras, depois que, pela milésima vez, mas agora com imagem mais chocante, seus comandados agiram com violência.
Não pega bem ser surpreendido com a mão na massa, é hora de parecer humilde, mas não tenho dúvida: seja na versão do original caricato, seja na do direitista envernizado, nos jogar da ponte é apenas uma questão de oportunidade. É para isso que serve o fascismo.
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Na Palestina segue o Holocausto, genocídio praticado pelo Estado de Israel, com o patrocínio dos Estados Unidos e da Europa. Como disse Chomsky, os palestinos têm o defeito de serem pobres; são jogados da ponte, e o mundo fica calado.
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